sexta-feira, 14 de maio de 2010

DESAFIO

Desafio


“-Morrer! E pensas no morrer! Descer do leito do amor à pedra fria dos mortos! (...) Morrer é a dúvida que afana a existência, (...) o pressentimento que resfria a fronte do suicida, que lhe passa nos cabelos como vento de inverno e nos impalidece a cabeça, (...) é a cessação de todos os sonhos, de todas as palpitações do peito, de todas as esperanças...” (Claudius Hermann – conto V- de Noite na Taverna, de Álvares de Azevedo).


Desafio, isso é o que nos motivou a escrever este livro. Porque a vida é um constante desafio. O maior deles é vencer a nós mesmos, vencer a nossa condição humana. Somos os poderosos e os mais frágeis de toda a natureza. Os mais sábios e no mesmo instante em que reinventamos constantemente a vida, somos capazes de destruí-la com o mesmo vigor.
Podemos tratar a questão da destruição sob várias ópticas e várias ciências. A Social, a Psicológica, a Psicossocial, a Ecológica... Porque não dizer que todas as ciências têm como objetivo final compreender a própria vida, o que a sustenta e como torná-la melhor, mais digna e mais longa?
Nosso objetivo, neste texto, é refletir sobre o que tratamos em nosso livro como um todo e resgatar, talvez, a nossa maior incompreensão humana: a Destruição do Outro e de Si Mesmo- Homicídio e Suicídio.
Se se levarmos em consideração alguns ensinamentos da Psicanálise/ Psicologia, veremos que oscilamos entre “dois mundos” dentro de nós mesmos. De um lado e do outro as nossas pulsões, instintos, desejos e a nossa consciência, ou inconsciência, moral, ética, estética. Nelas é que se traduzem em emoções dois instintos: os da vida e os da morte, a agressividade e a sexualidade. Tais pulsões não podem ser consideradas más ou boas, são instintos de sobrevivência, que garantem, se bem vividos, nosso equilíbrio e nossa existência.
Quando uma emoção (pulsão, instinto) se manifesta, nossos princípios, adquiridos socialmente, estão dispostos a reprimir ou não. Acontece que, muitas vezes, não nos conhecemos o suficiente para saber o que estamos reprimindo. Isto nos deixa como que insatisfeitos porque um lado de “mim mesmo” desejou e “outro” anulou sem escolher sua decisão. Esta frustração causou desequilíbrio e começa a viver como quem não se reconhece.
A agressividade positiva que me leva a conquistas como, por exemplo, a lutar pelo que quero, gosto, desejo (meu estudo, meu trabalho, minha realização) que me faz também me proteger do que faz mal ou impede minha realização (quando frustrada e não compreendida porque não reconheço minha emoção e não me reconheço nela) acaba por ser mal usada, mal colocada contra “mim mesmo” ou contra o “outro”. Torno-me destrutivo. Posso ser levado, literalmente ou implicitamente, ao ato de matar-me ou matar alguém, destruir-se ou destruir.
Como diz Dr.Albino, tais atos, atitudes, aparecem no “atacado” como suicídio e/ou homicídio (acidentes graves de trânsito, por exemplo), ou no “varejo”, como o “uso” ou a prática de ações destrutivas, como o uso de drogas licitas e elícitas principalmente, a irresponsabilidade no trânsito ou, diria também, com a incapacidade de construir-se e construir. Quantas pessoas vivem ao nosso redor somente destruindo e autodestruindo-se? Não reconhecem a si mesmos. Se frustram e não controlam seus próprios instintos.
Um dos autores que estudou o homicídio e o suicídio foi Menninger (1870). Entre outras “falas” nos espanta quando indica quantas vezes, por patologias das mais diversas, tenta-se destruir-se. Idealizamos, assim, nossa própria morte. Algumas patologias levam a várias tentativas. Parece haver nestas pessoas um continuum, um desejo maior que os levará a completar o ato quando isso não for tratado, não auxiliado. Porém, devemos lembrar que a doença (patologia) e o tratamento nem sempre vencem o “desejo” interior de matar-se ou matar. Menninger nos diz, por exemplo, que é possível que o suicídio esteja ligado a um desejo maior de voltar ao útero.
Não queremos aqui fazer uma abordagem científica, mas sim, dividir nosso conhecimento e nossa preocupação com esse ato humano, talvez o de maior incompreensão para todos nós.
Ao retomar o pensamento Freudiano, podemos dizer que ninguém se mata sem que esteja ao mesmo tempo matando um objeto com o qual se identificou, e também, voltando contra si mesmo um desejo de morte antes dirigido contra alguém. Suicídio é, antes de tudo, um homicídio, o homicídio de si próprio. Todo suicida, a nosso ver, é m homicida em potencial e vice-versa, dependendo da forma de buscar ou praticar o ato em si. Ser morto, então, pode ser compreendido como uma forma de submissão, e matar um ato de extrema agressão.
Todo sujeito que se relaciona com a morte é um representante da falta. Seja qual for sua história, haverá sempre uma perda irreparável, uma desestruturação de sua própria mente. Quando não podemos nos ver como um ser, mas apenas como um objeto, de dor, incompreendido, espectador de algo ou alguém que não reconhecemos ou compreendemos, nada mais resta do que sua destruição.
Não é nossa intenção esgotar esse assunto, que continua incompreendido e inaceitável. Queremos, sim, lembrar que homicídio e suicídio acabam nas folhas de jornais, nas cadeias e objetos da “ciência” que lhes julgará o Direito. Será que o Direito, as leis, poderão tratar de um assunto isoladamente das outras ciências?
Sentimos, por exemplo, uma enorme indignação diante de fatos como de pais que matam seus próprios filhos, que se matam diante de que os ama. Sentimos indignação com os suicídios coletivos. Sentimos repulsa com tantos acidentes de trânsito e com o excessivo uso de drogas, levando à destruição de milhares de jovens por morte e invalidez.
Será que o Direito poderá dar conta das implicações que geraram estas questões? Também no Direito a vida é o bem maior, e cabe ao Estado a sua proteção. Mas como dar conta de uma prática tão complexa?
Talvez, uma saída, seria implantar nas escolas, Detran’s, delegacias, pronto-socorros, presídios equipes multidisciplinares formada por médicos, psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais, a fim de estudar os conflitos gerados e solucionar problemas, bem como para o estudo de acidentes graves de causas desconhecidas. Evitaríamos a reincidência de atos, transgressões, infrações, delitos... Muitas vezes em concomitante cometidos, por pessoas portadoras de transtornos mentais, sem diagnóstico e sem tratamento. Para ratificar esta informação, já estivemos em presídios como o Carandiru, em São Paulo e alguns do Rio Grande do Sul.
A extensão deste tema nos convoca a propor que todo ato suicida e homicida seja estudado multidisciplinarmente. É necessário que as ciências se “encontrem” para melhor compreensão dos distúrbios humanos. É necessário também que as escolas e as famílias estejam mais atentas às crianças e aos jovens e que lhes sejam oferecidos profissionais capazes de reconstruir suas vidas quando a significação das mesmas está comprometida. No último congresso de Psiquiatria em 2009 em São Paulo, pesquisador Americano falou que a primeira causa de morte violenta no mundo foi sempre o suicídio e agora vem surpreendendo logo a seguir o homicídio e a principal causa é o Transtorno Afetivo.
Ao texto podemos acrescer que o atendimento à saúde mental dos detentos é de fundamental importância. Mentes insanas só tendem a agravar nas condições de nossas prisões, condições estas que vão desde ambientes promíscuos, falta de atividade laboral, falta de objetivo, grupos saudáveis terapêuticos. Poderíamos nos perguntar? Prender para que? Proteger a sociedade? Proteger o indivíduo de si mesmo? Não seria melhor se pudéssemos responder que o principal objetivo de nossa cadeias é a recuperação do ser humano? Castigo? Ou escola para continuar a criminalidade? Será que o presídio é melhor do que a sociedade e a família, considerando que mais de 80% retornam a prisão? Pesquisando o hospital psiquiátrico da Carolina do Norte, aonde os internados ou presos vinham da guerra do Vietnã, drogaditos, violentos, psicóticos... Constatamos que, quando saiam eram controlados por chips para monitorá-los e mantê-los em tratamento para não oferecerem risco. O presídio deve ser um centro de recuperação da vida, da saúde mental, educação para o trabalho.
Em 06/04/2010 no Jornal Zero Hora, folhas 41, mostra um exemplo ótimo em Santa Rosa, ex- presidiários criaram cooperativa afim de romper o preconceito e com isso buscar a recuperação familiar do trabalho e social com acompanhamento médico e da sociedade .
Enfim, ciências e fé, devem ser devolvidas ao ser humano, para isto é que foram criadas.
A humanidade tem a tarefa de resignificar-se e somente poderá fazê-lo se objetivar trazer de volta o verdadeiro sentido de viver, SER.

Certamente, este é o grande desafio da VIDA. Na prevenção da violência e a criminalidade a educação, saúde, segurança, justiça e trabalho.
Nota: com o título de Presídio Público Privado, foi encaminhado para sugestão da Governadora Ieda Crussius em 03.04.2009. agradeceu e enviou em 27.04.2009, encaminhando para secretario do Estado de Segurança Pública Edson de Oliveira Goulart, para tomar conhecimento.

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