Sempre que falamos em
terapia estamos considerando a presença de uma doença no organismo que
necessita de cuidados e tratamentos especiais.
Chamamos
de organismo todos os componentes que formam o ser humano – físico, mente, alma
– podendo também ser referência de outros seres da natureza.
Quando a doença é física,
a dor e os sintomas são mais evidentes, são palpáveis e, aparentemente, mais
desconfortáveis. Por isso e também por questões culturais já aprendemos a
procurar um médico.
No entanto, nas doenças
psíquicas e emocionais ainda não temos uma boa referência quanto à terapia ou,
ainda, as consideramos “coisa de louco” ou “artigo de luxo” e,
conseqüentemente, não faz parte da grande maioria do universo dos cidadãos brasileiros.
Porém, contrariando nosso
pensamento e comportamento, há um crescente aumento das doenças psíquicas e
emocionais, como depressão, vícios e problemas de aprendizagem, por exemplo.
Estas, a exemplo das doenças físicas, também trazem sofrimentos intensos que
conduzem à traumatização não somente de quem possui o distúrbio, assim como
todos que o cercam.
Por que este aumento
significativo das chamadas doenças da mente e das emoções? E por que a
resistência em procurar ajuda?
Encontramos
várias respostas para o que chamamos de doenças da psique humana. Basta olhar
para o mundo que nos cerca e para o modo como estamos vivendo e logo surgem
algumas explicações: a necessidade crescente de consumo, a insatisfação, a
violência, as exigências sociais, a ausência de valores, o pouco cultivo da
espiritualidade, a agitação, a falta de tempo.
Silva[1]
aponta que:
Há os carros do ano, os televisores, os computadores, os bens e insumos da tecnologia de ponta; há os mostruários, as vitrines dos luxuosos shoppings, que definitivamente estão fora do alcance dos deserdados pela sorte. Isto é desequilíbrio social, é violência generalizada. As pessoas dos centros urbanos destes tristes tempos tornaram-se agressivas, desassossegadas, ansiosas, tensas, estressadas, demasiadamente grosseiras. A amizade, a sinceridade, solidariedade, a preocupação com o semelhante, a empatia, etc., são valores perdidos pela sociedade urbana. Gemem os famintos desnutridos, os doentes sem assistência médica hospitalar. Da mesma forma murmura a multidão carregada de encargos sociais, impostos, taxas exorbitantes e pesados aluguéis, etc. As dívidas e a inadimplência tem pego a todos; da mesma forma que nos devem, devemos aos outros. Ninguém vive com tranqüilidade, todos estão mergulhados nas preocupações, que estão despedaçando o cérebro e ninguém mais tem felicidade.
Chamamos
estas questões de fatores externos. Porém não podemos esquecer que são
“criações” nossas e que consciente ou inconscientemente nos sentimos
co-responsáveis e até “culpados” por muitas situações que estão a nossa volta.
Há também
o que chamamos de fatores internos. Para a Psicologia e a Psicanálise, por
exemplo, importa buscar as causas do comportamento em algo que internamente não
foi elaborado, aceito ou assimilado. Para a Neuropsiquiatria, muitos destes
fatores internos são distúrbios orgânicos advindos do mau funcionamento
cerebral e hormonal. Para a Psicopedagogia podem ser aprendizagens mal
elaboradas, distúrbios na constituição do sujeito - falta de referência ou referência
negativa acerca de si mesmo – ou incapacidade para aprender. Tais doenças não
somente são difíceis de diagnosticar como também são difíceis de serem
admitidas. Por exemplo, da criança ou da pessoa que não aprende é mais fácil
dizer que é preguiçoso, é “burro”; da pessoa que bebe, que é “mau caráter”,
“sem vergonha”; do depressivo, que merece uma boa “surra”, que é “vagabundo”,
que não quer trabalhar.
Diante
destas questões percebemos o quanto é difícil procurar o tratamento adequado e
necessário. Muitas vezes quando o fazemos, a doença já está cronificada e sua
cura bem mais difícil.
Temos que
admitir também que os terapeutas deverão abrir-se para as realidades
sócio-econômicas.A tendência é de que a medicina se socialize cada vez mais
tanto nos aspectos relativos ao conhecimento quanto nas questões que dizem
respeito aos convênios, honorários e até mesmos atendimentos pelo SUS e/ou em
plantões ambulatoriais. O que queremos destacar é a importância de tornar
nossos serviços acessíveis e compreensíveis a toda população.
É preciso
reaprender nossa missão em relação à saúde e a nossa responsabilidade sobre
ela. Outra aprendizagem decorrente desta compreensão é o estabelecimento dos
limites de ação entre os diferentes profissionais da alma humana e como desenvolver
ações conjuntas e interdisciplinares com outras áreas médicas sem que o
paciente se sinta cindido, partido em seu bolso e em seu tempo.
A
quem procurar? Essa deve ser a pergunta que paciente e família angustiadamente
fazem diante das dificuldades e da doença. Ao que respondemos: sem sombra de
dúvidas, o médico e/ou o terapeuta de sua confiança. Por certo, se ele estiver
adequado ao seu tempo, agirá interdisciplinarmente, dando ao caso a direção
necessária.
Por fim,
é necessário trilhar os caminhos da ciência, mas também é necessário abrir-se
ao mundo e as suas novas e futuras realidades, esclarecendo e permitindo a
todos o acesso à saúde e à cura. Por certo isto não virá apenas de vontade
política, mas da vontade e da consciência de todos nós.
Admitir
que estamos doentes também é um passo importante para a busca da terapia e da
cura. Depressão, transtornos e vícios são doenças silenciosas e até mesmo
invisíveis ou imperceptíveis aos olhos dos outros. Muitos pacientes ficam
tentando driblar a doença e seus sintomas com muito esforço e com o pensamento
onipotente de que poderão obter a cura sozinhos.
Segundo
a Organização Mundial de Saúde (OMS), até 2020, a depressão será a
segunda maior causa de incapacitação da população mundial, perdendo apenas para
a doença cardíaca isquêmica[2].
Lembramos
que doença é doença e somente mãos e mentes preparadas poderão trazer a saúde
de volta.
Não é
sinal de fraqueza, mas de sabedoria cuidar da alma com o mesmo cuidado com que
cuidamos do corpo.
Médico Psiquiatra
Marisa Potiens Zílio
Psicopedagoga
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